sexta-feira, outubro 21, 2005

Esses estranhos medos televisivos


Na continuação do projeto do álbum das palmeirinhas, coloco agora outra foto bem legal de uma das realmente primeiras delas. O sobrinho de Durkheim, Mauss. Não dá pra deixar de sentir certo orgulho de ser antropólogo quando você tem ancestrais tão bons no que fizeram, mas ao mesmo tempo conseguem ser bastante divertidos e simpáticos, não? (Tudo bem, existem as exceções...) Talvez pela própria natureza da disciplina, do encontro, o antropólogo passe algo íntimo de si para aquele que lê seu trabalho. Pelo menos vários deles. E, como diz uma das únicas músicas do Chaetano que eu gosto, "de perto ninguém é normal".

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Conto também uma breve experiência, para falar sobre meu pavor de falar em público, ainda mais se é para uma tv.
Hoje, fazendo pausa nos trabalhos para comprar mantimentos no Pão de Açúcar local (esse mesmo do Cambuí), estava parado num farol vermelho do Centro de Convivência (aquele que dá pra Conceição) e vejo uma loira se aproximando, armada com um microfone e um cinegrafista a tira-colo. Gelei.
Quando cheguei o sinal já estava fechado, então sabia que iria abrir logo. Mas um medo automático me invadiu. "E se justo agora ele quebrou? E se o tempo resolver passar mais devagar justo neste momento?" Quem conhece um pouco sobre qual é a verdadeira natureza do destino, sabe que ter tais pensamentos negativos é mais do que justificado.
Com um canto do olho eu via a mulher se aproximar (estava no único carro na faixa da esquerda e ela estava na calçada do Centro de Convivência, seu território de caça) e ficava olhando, impaciente, o vermelho na minha frente, esperando que o verde do sinal dos pedestres começasse a piscar, o que indicaria que logo a cor mudaria e eu poderia fugir. Mas não piscava. Não abria. Pânico aumentando. Ela abriu a boca, empunhou o microfone ameaçadoramente e perguntou se poderia... O sinal de pedestres começou a piscar! Rápido, rápido! Abriu! Sorri pra moça, que viu o sinal abrir e voltou com seu microfone para a calçada, desapontada por não haver conseguido abocanhar sua presa. Acelerei e nem olhei para trás. Não soube nem que emissora era. Deveria ser uma dessas locais, porque não havia logo no microfone, como pude lembrar depois, já mais calmo e recomposto.
Relatado o caso, informo que minha experiência com a tv não é das melhores. Apareci no ar 4 vezes, que eu saiba. Uma delas foi quando era bem moleque, época que era viciado em histórias da Segunda Guerra Mundial (tenho parentes que morreram na Alemanha até). Sabia tudo sobre as principais batalhas, os comandantes e tal. Por muito tempo tive certeza que eu era um cientista austríaco que havia vivido nesta época, na minha encarnação passada. Acho que poderia ter sido meio estranho nesse ponto (depois que li o conto do Stephen King que originou aquele filme do menino que descobre um criminoso de guerra no seu bairro, fiquei ainda mais preocupado com isso - por um tempo), mas não é o caso de falar isso agora.
Enfim, nessa época descobriram que o Mengele, depois de ter fugido para a Argentina, havia vivido e morrido no Brasil. Afogado, mais precisamente. Em Bertioga. O Badan Palhares foi encarregado de fazer o laudo que confirmaria que a ossada exumada era do médico alemão. Meus pais, colegas do legista, contaram para o dito cujo do meu interesse pela Segunda Guerra e lá fui eu ver e tocar no crânio maldito. No mesmo dia ele apresentou o laudo, para várias tvs. Lá estou eu do seu lado. A primeira vez até que não teve nenhum trauma sério. Mas eu estava morrendo de vontade de ir no banheiro, e minha cara na tv é estranhíssima, no meio de toda aquela gente.
A segunda vez foi na MTV, em que apareço num show do Raimundos, no Junta Tribo, que aconteceu no observatório da Unicamp, totalmente coberto de pó (tirei terra de orifícios do meu corpo ao longo de toda aquela semana) e levando uma botinada de um punk que fazia mosh e pulou bem onde eu estava. O bico da bota acertou em cheio meu olho direito. Tive chance de rever isso outro dia, quando passou um especial de 10 anos (já?!) do Junta Tribo.
A terceira vez que apareci, foi um dia que estava na Unicamp nas férias. Quem foi pra Unicamp nas férias sabe como aquilo fica deserto. Bom, eu fui acompanhar meu amigo André, então estudante de arquitetura da PUCC, a filmar um projeto de urbanismo. Minha função era atirar uma bola de basquete, como se estivesse jogando boliche, através daqueles caminhos de pedrinha do ciclo básico enquanto ele filmava o trajeto da bola. Nunca entendi direito a proposta do filme. Acho que era algo sobre uma metáfora da circulação das pessoas. Bom, uma hora em que fui longe, quase na BC já, para pegar a bola depois de um arremesso muito eficaz, uma moça sorridente, seguida de um câmera carrancudo, se aproximou de mim e perguntou se eu não poderia dar uma entrevista sobre Viagra. Mal sabia o que era isso, o produto acabara de ser lançado. Disse isso aos dentes brancos, ao que estes me responderam que não tinha problema, eles me dariam uma pergunta para decorar e então fazer para a câmera. Não sei porque aceitei. Malditos dentes hipnóticos! Me posicionei frente à lente e disparei: "Gostaria de saber: Viagra vicia?" Deveria ser daqueles programas que aparece a pergunta do cidadão anônimo e preocupado e depois corta para a resposta do médico. A acionista da Colgate me disse em que canal e hora iria passar o negócio. Mas nessa altura já estava completamente arrependido. Nem quis assistir.
A quarta vez que apareci na tv, foi naquele canal 25 (quem tem net em Campinas sabe qual é: uma tv local que tem vários programas "jovens"). Tinha acabado de fazer tatuagem no Gatto e ele me falou que iria na tv falar sobre sua arte, perguntando para mim e para a Dani se não queríamos ir como clientes satisfeitos. Aceitamos. Lá estou eu, no canal 25, mostrando minha recém-feita tattoo e falando muita merda sobre período de cicatrização, como lidar com arrependimentos possíveis, sobre meu piercing e a Dani dando um fora na apresentadora imbecil que queria dar de feminista esclarecida, perguntando pra ela se não era verdade que as mulheres têm que bater nos homens (?!)...
Bom, desde a primeira tatuagem meu pai sempre brigou. Essa tinha feito sem falar nada. "Tudo bem" - pensei - "ninguém assiste essa porcaria mesmo". No dia seguinte meu pai, triste e bravo, me pergunta porque não contei que faria nova tatuagem. Não foi legal ele ter sabido por colegas no hospital! Fala sério, que médico fica assistindo canal 25 no meio da tarde, reconhece o filho do colega e no dia seguinte vai fofocar?
Agora não parece tão espantoso meu pavor do dia de hoje, quando vi aquela loira com o tailleurzinho preto de executiva-de-média-empresa se aproximando, não?

Um comentário:

Maria disse...

Chris, eu to rindo aqui sem parar.... meu deus!!! Quanto azar!!!!!!!!