sexta-feira, maio 30, 2008

Reflexões de uma boa aula

A moral desta tétrica história da menininha, para mim é que as narrativas do ocorrido são construções, são bricolagem com agendas pré-determinadas, nem um pouco isentas. Até aí nada de novo. O que é sim interessante de se pensar é acerca do limite alcançado (ou melhor, ainda não alcançado) por estas narrativas, vindas dos mais diferentes campos. Por quê tanta repercussão?
Os dados "objetivos" são utilizados na criação de verdadeiras histórias pseudo-coerentes. Coerentes, sim. Mas uma coerência arbitrária, seletiva. Traços de personalidade, e até menos do que isso: um simples comentário, um deslize, são provas irrefutáveis da culpa, que aparece aqui como irresistível, certa e inevitável. E nem falo dos que simplesmente supõem que as ações abomináveis são resultado das posições ocupadas no quadro de parentesco, ou pela posição social.
E a entrada deste novo personagem, que já veio assombrar a idéia de uma neutralidade e objetividade científica (forense) em outra oportunidade, para mim só reforça a idéia de construção, de ficção. Duas histórias completamente opostas podem surgir. Interpretações ou explicações? De onde se fala e qual é a legitimidade de quem fala. E surge a possibilidade da dúvida, que é a intenção da defesa, claro (e nem digo com isso que não seja possível uma ciência forense bem intencionada).

Isso me lembra bastante o que li sobre o caso do Jack, o mais famoso deles. Estudos minuciosos provam que ele foi um pintor expressionista inglês, foi o médico que teorizou a histeria, foi um membro da realeza sifilítico.

domingo, maio 25, 2008

Últimas

Ando bastante caseiro nos últimos tempos, mas rolaram duas boas baladinhas esta semana. A primeira mais... digamos... convencional (ainda que com sonzinho de queridas). Já a segunda foi meio esquisitinha (mas um esquisito bom).
Fui no pub que não é pub (mas ainda sim bacana, ainda que com atendimento que deixa um pouco a desejar), com discotecagem de amigos (muito boa, por sinal).

Bem, você passa pela vida fazendo amizades e participando de certos círculos. Ao longo da existência você se relaciona mais, ou menos, com determinadas pessoas, em determinadas épocas - algumas sempre voltam em algum momento e parecem nunca ter se distanciado, outras desaparecem nas brumas. E alguns amigos são amigos entre si, mesmo que não sejam dos mesmos círculos. Me espanto com alguns exemplos: "mas você conhece fulano? De onde?" Ainda que tenha percebido que realmente Campinas é uma kitnet (rolaria fácil uma análise antropológica de redes).
Na verdade, o esquisito, afirmado acima, foi que pessoas de várias dessas turminhas confluiram para o mencionado estabelecimento (lá não tem cerveja da ilha, mas felizmente eu já tinha matado minhas lombrigas um pouco antes).
Encontrei algumas pessoas que há muito não via, bebi e dancei. Foi uma noite leve, daquelas que tudo dá certo, tudo é engraçado e, mesmo desembolsando uma grana que eu não tenho, voltei contente, com dor na perna e tudo.
E minha querida amiga da capital continua linda (e cabeluda, heim?!)...

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Dei minha primeira aulinha esta semana! E foi logo para uma turma de mestrado! Claro que quase que tenho uma síncope, mas o resultado foi até encorajador. Quem sabe essa minha paúra docente não melhora?

quinta-feira, maio 15, 2008

Uma breve notícia

Esta é a tragédia de Henrieta C., carioca torcedora do Fluminense, que veio para São Paulo assistir à semifinal da libertadores contra o outro time tricolor, mas que justificou a viagem, para seu pai, por conta de numa exposição sobre a Natureza das Coisas, no MASP, já que fazia arquitetura na Puc.
Foi, na verdade, para a capital paulista com seu namoradinho Josias, e não com a turma da faculdade, que viajou para Ouro Preto em uma pesquisa de campo.
É certo que pensou na exposição como desculpa porque queria de fato visitá-la, ainda que num nível bastante ideal e platônico, já que não tinha intenção nenhuma de deixar de assistir o jogo. Josias tinha conseguido os ingressos dificílimos e não tinham como perder a oportunidade, agora que o Flu parecia estar com um time tão bom e competitivo, e já tão longe na competição.
O fato é que o pai de Henrieta, Rene, não gostava nem um pouco de Josias que, para ele, era simplesmente um malaco. Homem muito conservador e controlador, proibiu a filha de se encontrar com o Romeu. Pobre homem, ignorante das verdades dos corações jovens, já tão cantadas pelos poetas, que sabem que a probição é como combustível para a paixão, mas ainda tão misteriosas aos pais, que sempre acham que seus filhos são diferentes deles mesmos.
A menina achou que o melhor era inventar uma desculpa relacionada à sua formação, tão prezada pelo pai. Quanto a isso, nunca nada lhe era negado. E de qualquer forma estaria de volta no dia seguinte, sem problemas.
Mas quis o destino que Rene resolvesse assistir o jogo na tv aquela noite. E quiseram os deuses zombeteiros que a câmera focalizasse, quase no final da partida, a torcida carioca, e mostrasse Josias passando um baseado para Henrieta. Era o primeiro que ela fumava, mas estava tão inebriada pelo espetáculo e pelo inusitado da situação, que resolveu experimentar. Oportunidades não faltavam na faculdade, mas nunca quisera então. Uma coisa era seu cotidiano. Outra era esta experiência, tão única e quase surreal, um parênteses na sua vidinha.
Rene, boquiaberto na frente da tela, por um momento não acreditou no que viu. Sua filhinha estava em Minas! Mas a imagem era clara.
Copo na parede. Cacos no chão. Cerveja no tapete.

Murphinianas

Seria, afinal, o universo regido por forças não-aleatórias?
Todo mundo, quando lê as notícias de corrupção, covardia e vilanias em geral, no fundo vira um pouco budista vingador (ou cristão mesmo): em outra vida, ou em outro plano, aquele irá pagar. Vai arder no fogo do inferno, ou volta como um cupim manco.
E nem precisa ir muito longe na metafísica religiosa. Existe a lei da compensação secular - "aqui se faz, aqui se paga", e outros ditados do gênero (e se a justiça falha, pelo menos se espera que o safardanas durma mal, ou então que a história se encarregue de execrá-lo como merece - se o acerto de contas não se dá individualmente, quem sabe na memória, talvez).
Eu me pego sempre achando que existe algum princípio regulador no cosmos. Mas depois, invariavelmente, acabo me resignando, achando que o mundo é injusto mesmo e não tem o que se fazer - o último que sair que apague a luz. Entretanto, vem aquela pontinha de dúvida, de que as coisas se acertam, de alguma maneira, em algum momento - e acabo nunca escapando do círculo.
Nas últimas semanas tem reinado um princípio estrutural relacionado: de que quando as coisas param de funcionar, param todas ao mesmo tempo. É o banheiro que vira zona de guerra, mas também é o carro que sucumbe, o pneu que agoniza, a luz do escritório que pifa, a luz da cozinha que a acompanha, o interfone que fica mudo, o computador que pede arrego, a sola do sapato que desgruda.
Lá vou eu então testar o outro pricípio newtoniano da reciprocidade: vou jogar na mega-sena.

terça-feira, maio 13, 2008

Sobre reforma e madrugada

Pois bem, informo que minha capacidade cognitiva têm sofrido deveras com os trabalhos - que não são esotéricos mas ainda sim para-reais. Tenho a impressão de estar vivendo uma piada sem graça, uma parábola deveras exagerada. Quando penso que posso acordar, de fato vejo que nem dormi, e o despertar vem ao som das marteladas. É tudo quase psicodélico, em sua urgência cavalgante.
No começo achei um pouco irritante essa minha relação com os contratados. Não pela sujeira, incômodo ou barulho - tudo terrível, mas inevitável - mas pelas tais previsões que me dão. De quando terminaria (me foi dito inicialmente que seria uma semana, e não um mês - e contando), e de que material comprar: de nenhum cimento ("a gente se vira com um tiquinho da outra obra") para um saco 50 kg (que me ferrou as costas). Depois sair para comprar apenas mais um T de dois terços. Daí dois parafusos de cabeça chata, para então canos, sarrafos, misturadores, registros, isolantes, cola, fio, mais um saco de 50 kg (que acabou por me foder a lombar), e por aí vai (e vai longe). Você não acreditaria quanta coisa cabe num banheirinho. E, é claro, as tarefas me são dadas aos poucos; um produto de cada vez, à medida que são necessários, e não tudo junto em um só pedido.
É, isso me irritou no começo. Mas então, quando me senti como numa gincana de colégio e vi que teria, sim, que deselbolsar mais 100 aqui, mais 50 ali (que eu não tenho de fato), sair procurando madereira, loja de hidráulica, ovo de duas gemas e a pessoa mais velha que eu pudesse encontrar, me resignei. Agora acho tudo surreal, engraçado até. "Ok, vou procurar um start para 20 w. Não é que tenho nada melhor pra fazer mesmo".

Tenho cá algumas peculiaridades, que alguns podem considerar defeitos, mas que aprendi serem parte constituinte da pessoa que vos fala.
Como dormir tarde. Desisti de tentar me enganar, dizendo aos outros que irei acordar mais cedo, sair para caminhar com as primeiras luzes e sei-lá-mais-o-quê que normalmente se coloca na conta dos que têm o modelo de saúde a se emular. Eu durmo tarde, trabalho melhor de madrugada, acho que os melhores programas começam depois da hora da bobra e acho tudo muito mais tranquilo durante o reinado dos homenzinhos do Stevenson.
Sem a mulher de voz enjoada que vende pamonha, sem as buzinas, sem o bar azul, sem a vida que estaciona. O que é estranho, porque é exatamente nas primeiras horas que tudo parece congelar. Mas é quando tudo pára que se pode olhar pela janela e perceber o desenrolar de um simples movimento, despercebido que seria durante o dia. Voyeur singelo, adoro observar uma luz acendendo e tentar imaginar o que a pessoa está fazendo acordada; o piscar fantasmagórico de uma tv; um carro que passa solitário - vem de onde, vai para que canto? E mais, eu consigo me enxergar muito melhor.
Teço aqui minha ode e minha homenagem aos madrugadores, e aos insones como eu. Já sofro demais com isso para somar ainda mais uma neurose e achar que tudo é um lixo. Então digo que lido bem com isso (ainda que não recomende a ninguém).
Claro, nas últimas semanas este meu hábito trouxe problemas, pois é impossível continuar dormindo depois das 8, quando começam os mencionados trabalhos - no caso, uma reforma dos banheiros. Mas dormir cedo também não é uma opção. Resta torcer para que não surjam ainda mais imprevistos para o final das reformas.
E vou levando como Napoleão.

Mas nem tudo são espinhos. Informo que devo ter saído no Correio, na melhor pose pessoa-descolada-na-frente-de-seu-computador de orelha de livro (até fiz a barba, pasmem!). Engana-se quem pensa que seja algo relacionado à ciência do homem. Foi para uma matéria sobre video-game. O que contribui em muito para minha imagem de vagabundo sedentário, mas, enfim... é divertido (engraçado o fotógrafo, que queria uma foto ao lado do meu atari, mas teve que se contentar com o mouse mesmo).

Dentre as muitas outras possíveis notícias a se relatar neste espaço, ressalto apenas que finalmente assisti Coffee and Cigarettes (bem, o mais recente), ainda que não inteiro. Adoro o Jarmusch, mas ainda sim os filmes dele não são "de cabeceira"; não consigo assistir a qualquer hora.
Mas deve ser muito bom ser o cara. Amigos bacanas, respeitado, não precisa fazer muitas concessões, filma o que gosta, e agora se aproveita de uma boa estrutura que foi criada para os tais filmes cults, nos EUA. O equivalente na direção do que seria, por exemplo, o Bill Murray hoje.
E que vontade de café e cigarros...
(rápida menção: lembrei do diálogo entre o Jarmusch e o Keitel em Blue in the Face. Você não acredita que o Jim vai mesmo fumar seu último cigarro, depois daquela cena!)

domingo, maio 04, 2008

Gólgota

3 da manhã.
Volto de uma baladinha que teoricamente deveria reproduzir um pub londrino. Na prática, cerveja brahma e nada de guinness.
Mas sobre essa decepção falo outro dia.
O fato é que é uma dessas noites que poderia ficar bebendo indefinidamente, que não teria problema nenhum. Voltei porque não restaria ninguém no bar comigo. Sem nenhum sono e suficientemente alcoolizado para perder o pudor do entretenível, comecei a zapear a programação de sábado de madrugada. Lixo extremo. Por algum tempo fiquei entre um programa sobre terremotos na Turquia e a reprise de Anaconda - com uns pulos ocasionais para Troia dublado (e depois me censuram por criticar a lei de incentivo à cultura nacional).
Acabei indo para o VH1 em busca de uns clips podres e acabei por encontrar o supra-sumo da tosquice televisiva! A pérola, denominada Flavor of Love, é um The Bachelor versão Tião Macalé (sem o atenuante da anamnese pessoal e da paródia de si consciente), crossover teletubies on acid!
É o Flavor Flav envelhecido, tresloucado e acabado, com pitadas de chapeleiro louco, que escolhe a cada semana uma... nem sei que adjetivo adotar... uma guria para sair de seu harém dos infernos.
Fiquei pensando sobre as opções interpretativas e cheguei à conclusão que nenhuma implica em boa coisa:
Ou as mulheres estão realmente apaixonadas pelo Grande Otelo do rap, ou elas mentem descaradamente em prol de uma publicidade no mínimo dúbia (em que o público acredita na farsa), ou então todo mundo envolvido sabe que aquilo é um absurdo e é encenada uma tragédia hipócrita de proporções homéricas...

quinta-feira, maio 01, 2008

Primeiro de maio

Fazia muito tempo que as coisas não ficavam tão corridas.
Neste mês longe daqui muita coisa aconteceu - menininhas fofas nasceram, padres levantaram vôo, sublevou-se o país em hordas justiceiras e explicadoras, a Áustria assusta profundamente, surgiram (e desaparecerão) mulheres frutas (melâncias ou não). Realmente não foi por falta de novidades que deixei de dar uma atualizadinha no blog...
Ando às voltas com vários afazeres, um dos quais não muito prazeiroso, e que está restringindo meu sono em algumas horas diárias, ultimamente. Fazem a tal da reforma, finalmente. Atrasada em alguns anos, atrasada mesmo agora em sua execução. O que era para já ter terminado, se arrasta, me deixando louco e ainda mais surdo do que já sou.
Mas aconteceu uma coisa interessante por conta disso, que colocou em perspectiva minhas lamúrias laborais.
Claro que esse mito dos avanços trabalhistas pós revolução industrial é uma balela e não cola há tempos, mas quando me pego frente a frente com um caso concreto, ainda fico chocado.
O rapaz que vem quebrar pedra trabalha praticamente 20 horas por dia! Veio sem máscara, sem luvas, sem óculos... sem dormir. Sai daqui e vai para outro trabalho braçal, até de manhã, quando volta pra cá.
Ele tem o discurso empolgado de que pelo menos tem saúde pra continuar a trabalhar, então não tem do que reclamar. Mas se continuar assim, até quando?