quinta-feira, fevereiro 26, 2009

Sobre a saudade

Ontem meu irmão me mandou um vídeo que mostra "um dia em Abbey Road".

Fiquei emocionado. Por um ano passei por aquele cruzamento todo dia, algumas vezes por dia.

Os turistas que chegam em bandos, aos pares, ou sós. Em excursão, ou coincidentemente se juntam, esperando sua vez de andar pelas faixas tornadas célebres 40 anos antes. Ou mesmo se estão sem companhia, faça um dia ensolarado lindíssimo (como só existem em Londres, ou em semelhantes latitudes), ou de chuva que parece eterna - estão sempre lá (por vezes até mesmo de madrugada se pode encontrar os que lá se aventuram, para um registro menos disputado).

Por um ano eu fiz como os carros que são obrigados a parar diante da faixa, enquanto houver alguém andando ou ameaçando andar: esperava a fotografia ser feita. Porque essas pessoas, japoneses, americanos, brasileiros, franceses, argentinos, italianos, saem do circuito usual do turismo londrino (localizado mais ao sul) e chegam neste cruzamento apenas com um propósito, rápido: firmar uma mensagem no muro branco do estúdio localizado logo em frente e tirar uma fotografia emulando os reis do ié, ié, ié.

É um bairro lindíssimo, mas sem mais atrativos, minimamente interessantes, como uma loja ou outra residência histórica (porque todas são, paradoxalmente anulando a singularidade, pois elevada à enésima potência - o são completamente, sem possibilidade de comparação).

Talvez venham também os fãs de Kokoschka, célebre morador anônimo das redondezas, mas, relegado que é pela história da arte - e mesmo do expressionismo de que participou - não me parece atrair multidões.

Talvez venham também os que querem passear no zoológico e ver os gorilas e girafas. Mas para isso já têm que se distanciar rumo aos limites de St Johns Wood, em direção ao Regent's Park.

Pois então os que chegam, vindos de longe, incertos de quando voltarão - se é que voltarão, já que a moral toda parece ser semelhante a uma peregrinação que se deve fazer uma vez na vida, mas uma vez feita, o céu ou a iluminação pessoal estarão indelevelmente mais próximos, como a que fazem os muçulmanos a Meca, que fazem os cristãos a Fátima (ou ainda a Santiago de Compostela, para os mais aventureiros), e que fazem os judeus aos kibutz em Terra Santa - não hesitam em tomar 10 segundos do tempo dos moradores locais e prestarem seus respeitos em uma foto imortalizada. Aí perdem todas suas inibições, frente a estranhos que nunca mais verão ou a quem terão que se justificar. Aos veículos, não resta nada a não ser ter paciência (ou tomar um caminho alternativo). Aos moradores pedestres, compreensão - ou arriscar-se à irritação dos que o terão ao fundo como paisagem, até o final dos tempos ou do prazo de validade da imagem (que em tempos digitais, não sabemos precisar).

Mas raramente me irritava com essa atravessação incessante. E, assistindo agora esse vídeo, só me assalta uma saudade tremenda desse incômodo, que dava todo um sabor ao lugar onde morei, e, de uma maneira estranha, me permitia ser colocado em uma espécie de vórtice em que tantos desconhecidos - e quanto conhecidos, o que é igualmente fascinante - passaram e ainda irão passar.

Um imã gigantesco que atrai as bússulas, ou uma versão musical do triângulo das bermudas, a um quarteirão de casa.

quarta-feira, fevereiro 25, 2009

Ó jardineira por quê estás tão triste?

Como disse a Dani, finalmente algo para se elogiar do prefeito (além da rodoviária nova, que, se não é nenhuma maravilha, pelo menos tem o mérito de ter aposentado aquela coisa medonha anterior).

Os malditos bailes de carnaval, que nestes últimos anos eram responsáveis por dores de cabeça atrozes (ouvir a mesma música, n vezes ao dia, por 3 dias, num volume que faz parecer que a fanfarra acontece na parede ao lado, não é tarefa fácil), agora acabaram. Ou melhor, foram transferidos para um pouco mais longe - e agora com hora (decente) para acabar.
Tenho cada vez mais ódio de carnaval, a medida que vou envelhecendo (e olhe que eu até gostava de ir no clube soltar serpentina quando criança). E não há treinamento antropológico ou curiosidade etnográfica que me faça ter a mínima condescendência com - não o significado - o que de fato acontece durante esses dias fatídicos.

Meu professor de natação, natural de Olinda, me disse semana passada que eu tenho que ir um dia no carnaval de lá. "É preciso ir ao menos uma vez na vida; imperdível", foram suas palavras. "Dois milhões de foliões", me confessou, presumindo que eu seja um dos que acredita que quanto mais melhor, ou que a voz do povo..., ou que esse tanto de gente não pode estar errada. Ou se garantindo na fama que passou a existir sobre o carnaval de lá - algo como a Oktoberfest ou a festa de São Firmino em Pamplona: um must see.
"Mas nem fodendo", foi a resposta óbvia.

segunda-feira, fevereiro 23, 2009

And the Oscar goes to...

E Bollywood invade Hollywood.
Bom para o Danny Boyle, de quem sou fã!

Fiquei até um pouco surpreso pelo filme ter ganho algumas das principais categorias. Mas, de qualquer maneira, ainda é impressionante como para outras categorias dá para saber quem ganha mesmo sem assistir os filmes. Só pelo apelo da história ou do papel, bem a gosto sazonal e sem surpresa, na sua originalidade paradoxalmente previsível: o alternativo da vez.
Heath Ledger ganhar depois de tudo que falaram - fama impulsionada por algo bastante conhecido da funesta sociedade norte-americana; ou então Sean Penn ganhar pelo papel mais "ousado", que expia o conservadorismo de lá pelas migalhas do showbiz. Como se o enunciado glamouroso valesse pelas injustiças do cotidiano (bem, desculpem pelo cinismo. É claro que isso é melhor do que não haver nada. E viva o P.C. - não o partido comunista!).

Última nota: gostei do Hugh Jackman como apresentador (mas não mais do que o Billy Cristal; ainda que muito melhor que Whoopi Goldberg, ou os últimos apresentadores todos)! Pelo menos ele sabe dançar.

quinta-feira, fevereiro 12, 2009

Tradição familiar

Nesse final de semana chuvoso e abafado fui na casa do meu tio, comemorar o octagésimo quinto aniversário do meu avô. Tudo muito bom, cerveja gelada, carne gostosa, papo bom.
O cunhado da minha avó, marido de sua irmã, nunca vem nessas reuniões familiares, mas estava lá dessa vez. Eu costumava ir sempre na sua casa, lá na frente do bosque, quando era criança e ia visitar minha bisavó, que morava ao lado.
Pois não é que descobri que ele tem uma tatuagem? Não sei porque o papo foi pra esse lado, mas eu e meus primos pedimos para ver. Nada demais, na verdade. Um coração apagadinho com o nome da minha tia-avó dentro, já bem difícil de ler.
Nada demais. Se não fosse em um senhor de mais de 80 anos.
Eu lembro dele sempre tocando uma gaitinha, que leva pra cima e pra baixo (não foi diferente dessa vez). Mas foi legal saber que ele tinha uma tatuagem. Há quase 62 anos, feita com pena e tinta! A segunda informação, que não sei como podem ter certeza disso, mas é a lenda que corre na família, é que ele foi a primeira pessoa a se tatuar em Campinas. Não sei se não tinha pelo menos um marinheiro perdido por aqui na época da guerra, mas realmente devia ser pouco comum.
Enfim, quando eu tiver a idade dele, acho que será raro o avô que não tiver um rabisco qualquer no corpo. E o mundo vai ser, no mínimo, mais divertido.

quarta-feira, fevereiro 11, 2009

Algo sobre a crueldade dos comentaristas de futebol

Esperando dar a hora para ir nadar ontem (minha mais nova paixão - bem, talvez sejam as endorfinas falando) assisti o primeiro tempo do jogo da seleção (o decente, pelo que parece).
Assistir jogo da seleção não é um passatempo há tempos, mas gostei bastante do jogo (a parte que assisti pelo menos).
Uma coisa que me deixa irritado, entretanto, é como pegam no pé do Ronaldo II. Achei que jogou bem. Nada genial, mas até aí, quem é hoje em dia?
As pessoas podem ser muito cruéis. E o pior, nada originais. Sempre é um jogador pra Cristo (agora parece que é o Robinho) - por um tempo, todos falam todo dia, sobre qualquer coisa que o infeliz faça no dia. E esquecem o que o cara já fez ou jogou em um passado não muito distante. Ingratidão e memória curta.

Em 2006, estava em Barcelona e ganhei um presentão do cunhado catalão: um passe de jornalista para assistir um jogo no Camp Nou, no gramado! E fiquei realmente impressionado com o Ronaldo naquele dia. Ele tinha uma intensidade no olhar... No aquecimento dava para perceber como ele tinha o time no bolso, gritando orientações aos companheiros e dando uns chutões impressionantes pro alto e matando com um toquinho sutil. Completo controle dos comportamentos cinéticos da bola.
O jogo que fui assistir era a segunda partida da semifinal da Copa do Rei, contra o Zaragoza. O time catalão ganhou, de virada, mas não se classificou (acho que mencionei o jogo um tempo atrás, sobre aparecer na tv - eu apareci comemorando o jogo, o que queimou um pouco o filme do cunhado, porque se espera que os laranjinhas, da imprensa, sejam imparciais).
A grande decepção, entretanto, foi que o juiz acabou expulsando o Ronaldo ainda no primeiro tempo, numa jogada besta, que não merecia nem amarelo (aprendi vários palavrões em catalão naquela noite).
Eu tinha me preparado, levando uma camisa do Brasil e uma caneta para conseguir um autógrafo depois do jogo. E então tive que me contentar em ver o Messi (que naquela época já se mostrava excepcional, não me entenda mal). Mas achei que pegaria mal pedir para que ele autografasse uma camisa do Brasil.

segunda-feira, fevereiro 09, 2009

Besteirinhas do passado

Ultimamente tenho assistido alguns seriados mais antigos, na falta de coisas atuais que sejam decentes. Grandíssimo destaque para Twin Peaks, que na minha cabeça era muito bom e hoje ainda segura a atenção. Outro destaque é Millennium, que começou com uma trama muito legal, depois foi ficando meio forçado, é verdade (mas ter assistido na época deve ter sido muito mais interessante - coisa que infelizmente não fiz), mas que tem uns episódios geniais! Bem, geniais não sei. Talvez isso seja um pouco exagerado. Mas muito inteligentes e acima da média com certeza! E tal como Sopranos se sustenta em boa medida pelo Gandolfini, Millennium não poderia ser feito sem o Henriksen.
Procurem. Mas se começarem a ficar noiados... bem, é porque é o efeito desejado.

sexta-feira, fevereiro 06, 2009

Momento crise

E quando você percebe que a pessoa que conheceu por toda a vida de repente mudou? Quando ela faz outras amizades eternas, tem outros amores para sempre e mudou a vida de outras pessoas, que você nunca viu antes? Quando você se sente esquecido, mas, calado, sorri constrangido, levado pela culpa do egoísmo que é enxergar traição na felicidade alheia?

terça-feira, fevereiro 03, 2009

The kings of pop

Ontem assisti o Super Bowl XLIII, vencido de maneira emocionante pelos Steelers de Pittsburgh. Mas não vou falar do jogo, vencido nos últimos segundos.
Desde a final de três anos atrás, o Super Bowl X-Large, como foi conhecido, que assisti em um quarto de hotel alemão e que foi vencido pelos mesmos Steelers, que não acompanhava a breguice e o exagero da maior festa anual americana (já dados a festas exageradas) - do esporte e do entretenimento em geral.
O show do intervalo (milionário, como tudo mais envolvido no jogo), que ficou a cargo, dessa vez, pelo Bruce Springsteen (e nada de surpresas ou peitos de fora; apenas o símbolo do americano ideal), primou pela impressionante organização, como sempre aliás. Contudo, como seria de se esperar do evento, o halftime show significa e exemplifica perfeitamente o que é ser o supra sumo do pop e o que vem a ser a definição de "carne de vaca".
O tio é muito poser. A performance muito ensaiada. Demais até - mesmo que seja evidente que é preciso seguir um protocolo rídigo (afinal, 10 segundos de comercial custam mais de 1 milhão de dólares nessa baguaça). O que é perfeito para um Super Bowl, não me entendam mal. Mas ainda sim, algo me incomodou.
Cada pulo e cada acorde do chefe, que procuram mostrar improviso, são na verdade claramente coreografados. Isso não seria necessariamente ruim se assumissem o caráter previsível do negócio, como num show da Broadway, por exemplo. O problema é que se tenta passar por espontâneo e então a coisa fica muito forçada. Do tipo de sentir vergonha alheia, esse sentimento tão esquisito e que me horroriza profundamente.
Enfim, o espetáculo - show e jogo - é muito brega. Mas o mérito dos americanos, no Super Bowl e em praticamente tudo mais que fazem - até mesmo em posse de presidente eleito (e eis que temos um chefe de estado superstar! Gostaria de saber o que Weber diria sobre o Obama, mas isso é outra história...) - é tornar o brega, o artificial, o manjado, em algo empolgante. Sem cair em algo parecido com um show do Jean Michel Jarre. O que, convenhamos, é algo muito difícil de se fazer. A linha é tênue. As técnicas e a aparelhagem são muito parecidas.
É mesmo uma arte, arrisco dizer.

Breve adendo: por falar nisso, vi um show esse final de semana que primou pelo uso de lasers, luzes (piscantes e negra), espelhos e muita fumaça. E foi excelente! Como a música. Atentem para o Eletro Groove. Se eles forem tocar na sua cidade, vá! Os músicos são ótimos, a música hipnotizante e a diversão é garantida! (E leve um gatorade e muita disposição, porque eles tocam por horas a fio!)