Ontem assisti uns pedaços do documentário sobre o Vinicius de Moraes do Miguel Faria Jr. Não é um grande filme, analisando friamente, mas ainda sim bastante interessante, muito por conta da figura que foi Vinicius. Acredito que seria muito difícil fazer algo chato sobre o poeta.
O longa segue a fórmula da reunião de depoimentos de familiares e de amigos, muitos dos quais também personalidades da arte brasileira. Às vezes este formato dá certo, como no já mencionado e maravilhoso filme do Julian Temple que comentei por aqui há um ano, mais ou menos. É evidente que, para segurar a atenção, os depoentes têm que ter certo talento - o que não acontece em alguns momentos - e as anedotas do personagem têm também que ser singulares. No caso de um Vinicius isso não é um problema. Mas aqueles intervalos com declamações de poemas, ainda que bem intencionados, quebram um pouco do ritmo narrativo. Eu preferia que existissem mais cenas com falas do próprio poeta ao invés disso. Mas no final das contas valeu ter assistido.
Personagem realmente fascinante, Vinicius de Moraes passa um pouco batido por uma certa intelectualidade que se pretende mais refinada, como bem lembrou minha amiga Paulinha algumas semanas atrás. A popularidade de sua obra, imagino eu, acaba por esconder a qualidade de seus escritos. Que são muitas. E tão evidentes, que toda essa história cheira a dor de cotovelo.
Talvez o fato de ser uma figura meio incongruente, inverossímil, também tenha contribuído para a injusta fama de um poeta menor. Porque se trata de um tiozinho barrigudo, meio impertinente, que não corresponde nem ao trovador romântico, ou ao devasso maldito, tuberculoso e bêbado (ainda que em certa medida o fosse - bêbado pelo menos). O fato é que alguém que não tem medo de queimar realmente, que canta o amor visceral e não ideal, só pode ser alguém extraordinário, no sentido literal da palavra. Meio que fora do mundo.
Os depoimentos são interessantes neste sentido também. Em torno de Vinicius circularam estas pessoas, que se apropriaram de sua vida, ou da vida que lhes tocava, de qualquer maneira. São, assim, depoimentos impressionistas e impressionados.
É, na grande maioria das vezes, recordar inventando. Ou talvez inventar recordando. Já não sei mais.
Talvez a própria pessoa homenageada concordasse com muito do que foi dito, mas ao mesmo tempo, com nada. Porque com todas as anedotas, se repetindo, e voltando, reaparecendo e teimando, ele se aproxima mais e mais de um mito.
E este documentário só contribui para isso. Porque as pessoas que o conheceram não precisam de incentivo para lembrá-lo. Lembro de ter ouvido o Toquinho contar causos engraçadíssimos do colega em várias oportunidades. Carlinhos Lyma também. Há bem uns 10 anos, fui assistir um show do Chico, no agora extinto Palace. Lembro bem dele também ter se rendido - me perdoem o trocadilho - ter se rendido ao vício de falar de Vinicius.
É, no final das contas, com todos os copos de whisky, todas as mulheres, as músicas e o pigarro, alguém invejável. Triste e acuado pelo mundo, ainda sim conseguia fazer o que queria. Uma inveja que não se sente, por exemplo, por outros velhos barrigudos e bêbados da literatura.
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