Estamos agora em Barcelona, depois de passar uns dias em Madrid! O engraçado, depois de fazer um trabalho sobre o transnacionalismo e o hibridismo cultural, foi chegar aqui e ver que a questao da imigraçao está seríssima, os madrileños estao preocupadíssimos com o estatut català e a defesa do batasuna basco. Barcelona pede uns papéis roubados por Franco, o alcade local se recusa e fala pra polícia local enfrentar a polícia do estado. Daí o alcade de outra cidade resolve que umas obras de arte que estao na Catalunha sao deles, e exige sua devoluçao. E a questao da língua também está em todas as discussoes...
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Meu celular nao funciona em Barao, na Unicamp serve como relógio e olhe lá! Mas na Espanha... funciona que é uma beleza!
domingo, janeiro 22, 2006
domingo, janeiro 15, 2006
Balonismo
Ontem fomos andar de balão em Piracicaba! Muito legal, bonito e nada assustador. Quer dizer, me espantei com a velocidade que o negócio sobe! E ficava com medo do meu boné e dos meus óculos caírem, mas fora isso...
Tivemos que ir ante-ontem à noite dormir em Piracicaba, já que o passeio começava às 7. Saímos do gramado da lindíssima ESALQ, bem cedinho, com aquela luz mortiça que há muito tempo não via (acordar cedo não é comigo). Aliás, a cidade toda é muito bonita, arborizada e tranquila.
O cara, de nome eslavo, filho de ucranianos, Feodor, era muito ninja. Eu achava que era tudo muito pouco navegável. Mas que nada, ele sabia direitinho o quanto subir e o quanto descer pra pegar as correntes de ar. Muito estranho, aliás, o fato de não sentirmos vento. O que no fundo é óbvio, já que viajamos nele. E ouvir os cachorros da cidade inteira latindo é divertido também!
Mas o piloto era muito bom mesmo. Ele baixou o balão até encostar nas águas do rio Piracicaba e então voltou a subir, tirava finas de árvores... pousou exatamente onde disse que iria. Isso só com 1 gps e o abrir e fechar de uma labareda quentíssima em cima de nossas cabeças! Quer dizer, há algo de improviso, ele disse. O que dá um toque especial para tudo, acho eu. Longe de ser algo exato, é meio um toma lá da cá entre as variações climáticas e a perícia do balonista.
Chegamos a 600 metros de altura, o que me parecia altíssimo já. E ele disse que já foi até 9000 metros!
Na aterrissagem ganhamos um lanche, frutas, café, bolo e champanhe - que, segundo Feodor, é tradicional entre os balonistas. Tradição que remonta aos primórdios do esporte, na França do século XVIII. Os primeiros balonistas desciam, invariavelmente, em alguma fazenda ou propriedade privada. Traziam a tira-colo, junto com os sacos de areia e a estranheza toda do negócio, uma garrafa de champanhe, a fim de confraternizar com o proprietário do lugar. Demonstravam assim que eram humanos e, mais importante, creio eu, que eram franceses.
Enfim, valeu a pena.
Aí de noite fomos na nachada sazonal do Chaplin. Acho que estava tudo mundo com muito sono e calor (que calor foi aquele?!) e muita gente não veio. Mas foi divertido mesmo assim. Ficamos conversando e suando, comendo nachos e burritos, passando mal com cerveja quente. Valeu por ter encontrado a Cris, que foi lá também! Cris, as nachadas não costumam ser tão estranhas como foi ontem! Mas deu pra dar uma descansada, não?
quinta-feira, janeiro 12, 2006
Rápidas
Pois é, estou quase de férias. Ainda digladiando com o texto do Bhabha, mas a batalha está quase finda. E, como diz a Dani, babando por vezes. Quando entendo o que ele quer dizer eu acho muito bom! Na verdade acho que é o melhor que li em muito tempo em ciências sociais (se é que ele pode ser definido como das cs). Mas amanhã já termino e posso curtir um pouco o verão, antes de bater dentes semana que vem. Sábado, se eu não pagar pau (conto depois o que é, se eu de fato fizer), risco um ítem da famosa lista das coisas a se fazer antes de morrer! A árvore eu já plantei...
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É difícil ser tão íntimo de Murphy. Justo quando tem Misfits, And 1 e bbb, não estarei por aqui!
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E não é que o Hoffmann, o pai da dietilamina, viu nosso planeta cirandar uma centena de vezes em volta da mais próxima estrelinha?
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É difícil ser tão íntimo de Murphy. Justo quando tem Misfits, And 1 e bbb, não estarei por aqui!
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E não é que o Hoffmann, o pai da dietilamina, viu nosso planeta cirandar uma centena de vezes em volta da mais próxima estrelinha?
domingo, janeiro 08, 2006
Histórias de outrora
Hoje fui almoçar na casa dos meus avós com a Dani e meu pai. Fazia tempo que não ia passar um tempinho com eles, o que me deixa um pouco triste, já que eu adoro conversar com os dois e ouvir suas histórias, e eles já estão ficando muito velhinhos .
Depois de uma deliciosa moranga com carne seca e catupiry (ou jabá com jerimum), um vinho tinto seco do Sul e o delicioso manjar branco da minha vó (que desde que me conheço por gente é servido nas ocasiões festivas, geralmente na forma de porquinho, mas hoje na forma de peixe), ficamos à mesa tomando café e falando bobagem. Vira e mexe eles começam a contar coisas que aconteceram há 50, 60 anos atrás. Eu adoro ouvir e imaginar como eram as coisas naquele tempo. Campinas com bonde e poucos carros, ainda com charretes, as pessoas de chapéu...
Agora com essa série JK, eles, que adoram novela e mini-série da globo, ficaram me contando do programa, alternando com suas próprias recordações do tempo. E falaram do JK, do Jango, do Lacerda... como no ano novo, quando fiquei horas ouvindo histórias do avô da Dani, inclusive um pouco mais velho que meus avós.
Meu avô me contou como seu pai dizia que a minha avó devia ser doente, porque comia pouco e falava baixinho. Você será viúvo cedo meu filho, dizia preocupado e pesaroso. E essa maledeta ainda está viva, exclamava meu avô! Minha avó então dava risada, lembrando do choque que foi sair de uma austera família germânica e de um colégio de freiras e entrar na algazarra que é a família Tambascia.
Minha avó, aliás, era lindíssima. Até o retrato estragar com algum tipo de fungo, lembro que fitava impressionado uma foto que ficava na sala, em que ela, mocinha, olhava o horizonte na melhor pose Marlene Dietrich. As histórias do começo do namoro dos dois são muito bonitas. O cortejo, as tentativas de meu vô em driblar a seriedade do velho Ferdinand Hass, os primeiros passeios de mãos dadas... há seis décadas!
Bom, lá pelas tantas perguntei pro meu avô sobre a guerra. Me lembrava de uma história de que ele tinha sido convocado, mas não embarcou porque a guerra havia acabado. Não, disse ele, foi meu irmão Donato. Ele já havia inclusive ido para Santos para embarcar para a Itália quando a guerra acabou. Meu vô seria convocado dentro em breve.
Aí ele me contou a história de como meu tio-avô fora convocado em São José do Rio Pardo, onde havia nascido, e ido treinar no Mato Grosso antes do embarque. Um sargento do tiro de guerra campineiro, que conhecia meu bisavô Nicolino, soube que o regimento da FEB em que meu tio-avô Donato estava iria para Santos, mas antes passaria por Campinas, em um trem da Sorocabana (que aliás foi criada pelos maçons perseverantes que tanto conheci fazendo o trabalho para a Suely. Um húngaro, de sobrenome Maylasky, figura interessantíssima que aportou em terras paulistas nas últimas décadas do século XIX, foi o grande mentor do empreendimento). Meu bisavô Nicolino, que estava contrariadíssimo por ter um filho que iria lutar na guerra, ainda por cima contra seus antepassados italianos, foi com meu vô para a estação da Cia Paulista de Estradas de Ferro - hoje FEPASA - se despedir de Donato. Estava desesperado e chorava copiosamente, segundo meu avô. E mais ainda quando descobriu que chegaram atrasados e o trem já havia passado. Eles haviam se visto uma única vez desde a convocação tempos antes, ocasião em que meu vô tirou uma foto de seu irmão todo fardado.
Chegado em Santos e esperando o "vapor" que o levaria à terra ancestral, meu tio-avô ficou algumas semanas montando guarda como sentinela no forte de Bertioga. Um dia, segundo meu avô, ele ouviu barulhos na escuridão e viu uma figura sorrateira se aproximando.
Alto, quem vem lá? Identifique-se ou passo fogo! Uma voz feminina exclamou baixinho pedindo calma. Era uma moça da região, que havia preparado um bolo para dar ao meu tio-avô, por dó e caridade. Não sei como se conheceram. Meu vô também não sabia. Me parecia história de romance. Mas nessa hora ele ficou muito emocionado, colocou a mão no rosto e começou a chorar.
Fiquei constragido e quis mudar de assunto, mas meu avô se pôs a concluir a história, falando pausadamente quando as lágrimas vinham mais fortes. Em algumas partes nem cheguei a entender o que dizia, mas fiquei sem jeito de interromper.
No final das contas ele contou que pouco antes de navegar para a Itália, haviam dado a notícia de que a guerra terminava. Seu irmão voltou para casa, mas por um triz não embarcara. Ao que parece, se a guerra durasse mais pouco, ele teria ido para a guerra, e tanto meu avô como seu irmão menor teriam sido convocados também.
Mas meu vô me contou que tinha um amigo mais velho, com quem trabalhara em uma loja, como garoto de recados, em 1936 (número 1600 e pouco da Francisco Glicério, onde hoje funciona uma farmácia), foi mandado para a Itália, e de lá não voltou, morto em alguma batalha contra os alemães. Este amigo virou nome de rua em Campinas.
Ao irmos embora meu pai me disse que sempre que meu avô fala deste irmão se emociona muito. Coisa que entre os Tambascia não é muito difícil, convenhamos. Não tenho memórias muito claras dele. Morreu há alguns anos atrás, mas quase não o víamos. Segundo meu pai, seu tio Donato comia um ovo por dia toda manhã, durante toda a vida. Parou pouco antes de morrer, quando alguém o aterrorizou com histórias de colesterol. Morreu com quase noventa anos, com o colesterol normal, normal.
Depois de uma deliciosa moranga com carne seca e catupiry (ou jabá com jerimum), um vinho tinto seco do Sul e o delicioso manjar branco da minha vó (que desde que me conheço por gente é servido nas ocasiões festivas, geralmente na forma de porquinho, mas hoje na forma de peixe), ficamos à mesa tomando café e falando bobagem. Vira e mexe eles começam a contar coisas que aconteceram há 50, 60 anos atrás. Eu adoro ouvir e imaginar como eram as coisas naquele tempo. Campinas com bonde e poucos carros, ainda com charretes, as pessoas de chapéu...
Agora com essa série JK, eles, que adoram novela e mini-série da globo, ficaram me contando do programa, alternando com suas próprias recordações do tempo. E falaram do JK, do Jango, do Lacerda... como no ano novo, quando fiquei horas ouvindo histórias do avô da Dani, inclusive um pouco mais velho que meus avós.
Meu avô me contou como seu pai dizia que a minha avó devia ser doente, porque comia pouco e falava baixinho. Você será viúvo cedo meu filho, dizia preocupado e pesaroso. E essa maledeta ainda está viva, exclamava meu avô! Minha avó então dava risada, lembrando do choque que foi sair de uma austera família germânica e de um colégio de freiras e entrar na algazarra que é a família Tambascia.
Minha avó, aliás, era lindíssima. Até o retrato estragar com algum tipo de fungo, lembro que fitava impressionado uma foto que ficava na sala, em que ela, mocinha, olhava o horizonte na melhor pose Marlene Dietrich. As histórias do começo do namoro dos dois são muito bonitas. O cortejo, as tentativas de meu vô em driblar a seriedade do velho Ferdinand Hass, os primeiros passeios de mãos dadas... há seis décadas!
Bom, lá pelas tantas perguntei pro meu avô sobre a guerra. Me lembrava de uma história de que ele tinha sido convocado, mas não embarcou porque a guerra havia acabado. Não, disse ele, foi meu irmão Donato. Ele já havia inclusive ido para Santos para embarcar para a Itália quando a guerra acabou. Meu vô seria convocado dentro em breve.
Aí ele me contou a história de como meu tio-avô fora convocado em São José do Rio Pardo, onde havia nascido, e ido treinar no Mato Grosso antes do embarque. Um sargento do tiro de guerra campineiro, que conhecia meu bisavô Nicolino, soube que o regimento da FEB em que meu tio-avô Donato estava iria para Santos, mas antes passaria por Campinas, em um trem da Sorocabana (que aliás foi criada pelos maçons perseverantes que tanto conheci fazendo o trabalho para a Suely. Um húngaro, de sobrenome Maylasky, figura interessantíssima que aportou em terras paulistas nas últimas décadas do século XIX, foi o grande mentor do empreendimento). Meu bisavô Nicolino, que estava contrariadíssimo por ter um filho que iria lutar na guerra, ainda por cima contra seus antepassados italianos, foi com meu vô para a estação da Cia Paulista de Estradas de Ferro - hoje FEPASA - se despedir de Donato. Estava desesperado e chorava copiosamente, segundo meu avô. E mais ainda quando descobriu que chegaram atrasados e o trem já havia passado. Eles haviam se visto uma única vez desde a convocação tempos antes, ocasião em que meu vô tirou uma foto de seu irmão todo fardado.
Chegado em Santos e esperando o "vapor" que o levaria à terra ancestral, meu tio-avô ficou algumas semanas montando guarda como sentinela no forte de Bertioga. Um dia, segundo meu avô, ele ouviu barulhos na escuridão e viu uma figura sorrateira se aproximando.
Alto, quem vem lá? Identifique-se ou passo fogo! Uma voz feminina exclamou baixinho pedindo calma. Era uma moça da região, que havia preparado um bolo para dar ao meu tio-avô, por dó e caridade. Não sei como se conheceram. Meu vô também não sabia. Me parecia história de romance. Mas nessa hora ele ficou muito emocionado, colocou a mão no rosto e começou a chorar.
Fiquei constragido e quis mudar de assunto, mas meu avô se pôs a concluir a história, falando pausadamente quando as lágrimas vinham mais fortes. Em algumas partes nem cheguei a entender o que dizia, mas fiquei sem jeito de interromper.
No final das contas ele contou que pouco antes de navegar para a Itália, haviam dado a notícia de que a guerra terminava. Seu irmão voltou para casa, mas por um triz não embarcara. Ao que parece, se a guerra durasse mais pouco, ele teria ido para a guerra, e tanto meu avô como seu irmão menor teriam sido convocados também.
Mas meu vô me contou que tinha um amigo mais velho, com quem trabalhara em uma loja, como garoto de recados, em 1936 (número 1600 e pouco da Francisco Glicério, onde hoje funciona uma farmácia), foi mandado para a Itália, e de lá não voltou, morto em alguma batalha contra os alemães. Este amigo virou nome de rua em Campinas.
Ao irmos embora meu pai me disse que sempre que meu avô fala deste irmão se emociona muito. Coisa que entre os Tambascia não é muito difícil, convenhamos. Não tenho memórias muito claras dele. Morreu há alguns anos atrás, mas quase não o víamos. Segundo meu pai, seu tio Donato comia um ovo por dia toda manhã, durante toda a vida. Parou pouco antes de morrer, quando alguém o aterrorizou com histórias de colesterol. Morreu com quase noventa anos, com o colesterol normal, normal.
sábado, janeiro 07, 2006
Morte e Vida Severino
Tive um professor chamado Severino. Severino demonstrava as técnicas maravilhosas de redação e argumentação. Se aventurava a dar aulas de literatura quando necessário, e até mesmo exibia algumas noções de retórica para iniciantes. Afinal, estou cada vez mais convencido, o mundo não está aí. Veritati et innocentiae meae nusquam locus est (Tácito).
A máxima da inspiração e transpiração era levada a sério nas suas aulas. Mas para transpirar, ora, para transpirar, você tinha que ser bom - e inspirado.
Severino era alto. Alto em altura, mas também porque andava suave e imponente. Parecia maior. Quando você percebia, lá estava. E ia igualmente sem alarde. Cabelos cacheados castanhos e barba castanha bem cortada, mas intensa. Olhos azuis muito claros - quase água. Sempre de óculos em harmonia com o rosto. Voz tranquila, de barítono, cadência baiana mas sem sotaque. Camisas xadrez eram suas preferidas. Sapatos de mocassim.
As pessoas diziam que ele havia nascido no século retrasado (diziam "século passado", mas isso, afinal, foi no século passado...). Ele tinha outro ritmo.
De qualquer maneira, ele me ensinou a escrever de fato. Cheguei à conclusão que antes eu era apenas alfabetizado, mesmo com 16 anos.
Redação era disciplina para os sonhadores, a maioria se contentava em fazer o texto-fórmula para conseguir média. Eu me debruçava no papel (que computador que nada) em busca de um elogio, que me deixava vermelho, mas sempre com ânsia de um novo pico.
Severino amava boxe, o que causava estranhamento entre os mais desavisados. Idolatrava Cassius Clay o original, Joe Frazer e Sugar Ray Leonard. Nada da truculência de Mike Tyson. Às vezes ficava metade da aula discorrendo sobre a arte do boxe, o ringue, a dança, o embate - com as mãos e as palavras. Algo muito próximo da análise da tauromaquia de Michel Leiris - fenômeno que muitos, tal como com o boxe, não consideram uma arte e sim uma atrocidade.
Quando falava sobre boxe, Severino se empolgava. Toda a fragilidade que lhe era característica desaparecia momentaneamente.
Mas sempre ficava com a impressão de que suas palestras sobre a esgrima dos punhos eram uma batalha perdida. Ele sabia disso, mas não podia evitar. Falava de sua paixão para alunos que, quando ouviam, consideravam tudo aquilo apenas uma contradição pitoresca, uma pessoa tão doce, que ensinava os prodígios de Drumond, E agora José, e as originalidades de Bandeira, Pneumotórax, gostava, pasmem, de pancadaria! Mas vira e mexe voltava a contar sobre alguma luta memorável e a vida de algum lutador.
Me lembro que ele tinha outro ídolo: Giordano Bruno, oriundo da mesma Campania dos meus antepassados. Figura fascinante, de andanças e feitos prodigiosos, Bruno merecia admiração de Severino por tudo que fez e pela recusa da retratação, que lhe valeu a fogueira. Mas os feitos, estes são temperados com posturas. Ele sempre falava de Bruno em relação a Galileu, da mesma forma que falava de Frazer em relação a Tyson, ao me parecia. Algo como outro professor de literatura fazia com Chico de um lado e Caetano e Gil de outro. Um certo respeito pela desgraça em consequência do caminho mais difícil. Vida sofrida severina.
Não sei se Severino ainda é professor de redação. Mas sinto saudades e lhe sou grato por tudo que poderia ter sido e não foi... Porque nem sempre a potencialidade é coisa boa.
A máxima da inspiração e transpiração era levada a sério nas suas aulas. Mas para transpirar, ora, para transpirar, você tinha que ser bom - e inspirado.
Severino era alto. Alto em altura, mas também porque andava suave e imponente. Parecia maior. Quando você percebia, lá estava. E ia igualmente sem alarde. Cabelos cacheados castanhos e barba castanha bem cortada, mas intensa. Olhos azuis muito claros - quase água. Sempre de óculos em harmonia com o rosto. Voz tranquila, de barítono, cadência baiana mas sem sotaque. Camisas xadrez eram suas preferidas. Sapatos de mocassim.
As pessoas diziam que ele havia nascido no século retrasado (diziam "século passado", mas isso, afinal, foi no século passado...). Ele tinha outro ritmo.
De qualquer maneira, ele me ensinou a escrever de fato. Cheguei à conclusão que antes eu era apenas alfabetizado, mesmo com 16 anos.
Redação era disciplina para os sonhadores, a maioria se contentava em fazer o texto-fórmula para conseguir média. Eu me debruçava no papel (que computador que nada) em busca de um elogio, que me deixava vermelho, mas sempre com ânsia de um novo pico.
Severino amava boxe, o que causava estranhamento entre os mais desavisados. Idolatrava Cassius Clay o original, Joe Frazer e Sugar Ray Leonard. Nada da truculência de Mike Tyson. Às vezes ficava metade da aula discorrendo sobre a arte do boxe, o ringue, a dança, o embate - com as mãos e as palavras. Algo muito próximo da análise da tauromaquia de Michel Leiris - fenômeno que muitos, tal como com o boxe, não consideram uma arte e sim uma atrocidade.
Quando falava sobre boxe, Severino se empolgava. Toda a fragilidade que lhe era característica desaparecia momentaneamente.
Mas sempre ficava com a impressão de que suas palestras sobre a esgrima dos punhos eram uma batalha perdida. Ele sabia disso, mas não podia evitar. Falava de sua paixão para alunos que, quando ouviam, consideravam tudo aquilo apenas uma contradição pitoresca, uma pessoa tão doce, que ensinava os prodígios de Drumond, E agora José, e as originalidades de Bandeira, Pneumotórax, gostava, pasmem, de pancadaria! Mas vira e mexe voltava a contar sobre alguma luta memorável e a vida de algum lutador.
Me lembro que ele tinha outro ídolo: Giordano Bruno, oriundo da mesma Campania dos meus antepassados. Figura fascinante, de andanças e feitos prodigiosos, Bruno merecia admiração de Severino por tudo que fez e pela recusa da retratação, que lhe valeu a fogueira. Mas os feitos, estes são temperados com posturas. Ele sempre falava de Bruno em relação a Galileu, da mesma forma que falava de Frazer em relação a Tyson, ao me parecia. Algo como outro professor de literatura fazia com Chico de um lado e Caetano e Gil de outro. Um certo respeito pela desgraça em consequência do caminho mais difícil. Vida sofrida severina.
Não sei se Severino ainda é professor de redação. Mas sinto saudades e lhe sou grato por tudo que poderia ter sido e não foi... Porque nem sempre a potencialidade é coisa boa.
quinta-feira, janeiro 05, 2006
All that jazz
Dica cinematográfica muito legal: L'auberge Espagnole.
Zapeando o canal na casa da minha mãe, acabei topando com umas cenas barcelonesas num filme e resolvi ver do que se tratava.
O protagonista era um tapado estranho e quase mudei de novo. Mas continuei assistindo. Queria ver se entendia o francês e o catalão. Mas aí, acabei gostando e assisti até o final. Muito bonitinho (a melhor palavra para descrever o filme. Os filmes franceses ultimamente têm sido bonitinhos... ainda mais se têm a Audrey Tautou), me vi lembrando de várias coisas que aconteceram comigo - nesta mesma cidade, mas em todo lugar também - e de várias que poderiam ter acontecido. Ou de coisas que se acontecessem, talvez agisse da forma como o cara agiu.
Achei legal também como o diretor resolveu umas coisas na história. Deu a impressão que ele realmente assiste cinema. Quer dizer, sabe do que não funciona e tentou não fazer igual. Daquelas coisas que sempre comentamos com os amigos no final do filme, mas no seguite... lá estão elas de novo, sabe? Existem pessoas parecidas com a gente por aí!
No final, o que mais gostei foi pensar em como pessoas se encontram por acaso, simpatizam ou não umas com as outras, convivem, brigam, mas acabam vivendo (no sentido literal) juntas. E daí pra algo muito próximo do amor, não precisa muito. Mas tudo é efêmero, logo você precisa continuar e virar algo diferente. E então a lembrança do que foi e você nem percebeu, volta amarga por vezes, mas suave na maior parte do tempo. Só que aquela sensação de que algo maravilhoso e pessoas lindas de alguma forma passaram, é inevitável. Mesmo que você as veja novamente anos depois. Algo muito próximo do que cantou Bandeira, creio.
Resta, como o filme tentou passar, torná-las você mesmo. E perceber isso. Mesmo que seja muito tempo depois.
Zapeando o canal na casa da minha mãe, acabei topando com umas cenas barcelonesas num filme e resolvi ver do que se tratava.
O protagonista era um tapado estranho e quase mudei de novo. Mas continuei assistindo. Queria ver se entendia o francês e o catalão. Mas aí, acabei gostando e assisti até o final. Muito bonitinho (a melhor palavra para descrever o filme. Os filmes franceses ultimamente têm sido bonitinhos... ainda mais se têm a Audrey Tautou), me vi lembrando de várias coisas que aconteceram comigo - nesta mesma cidade, mas em todo lugar também - e de várias que poderiam ter acontecido. Ou de coisas que se acontecessem, talvez agisse da forma como o cara agiu.
Achei legal também como o diretor resolveu umas coisas na história. Deu a impressão que ele realmente assiste cinema. Quer dizer, sabe do que não funciona e tentou não fazer igual. Daquelas coisas que sempre comentamos com os amigos no final do filme, mas no seguite... lá estão elas de novo, sabe? Existem pessoas parecidas com a gente por aí!
No final, o que mais gostei foi pensar em como pessoas se encontram por acaso, simpatizam ou não umas com as outras, convivem, brigam, mas acabam vivendo (no sentido literal) juntas. E daí pra algo muito próximo do amor, não precisa muito. Mas tudo é efêmero, logo você precisa continuar e virar algo diferente. E então a lembrança do que foi e você nem percebeu, volta amarga por vezes, mas suave na maior parte do tempo. Só que aquela sensação de que algo maravilhoso e pessoas lindas de alguma forma passaram, é inevitável. Mesmo que você as veja novamente anos depois. Algo muito próximo do que cantou Bandeira, creio.
Resta, como o filme tentou passar, torná-las você mesmo. E perceber isso. Mesmo que seja muito tempo depois.
terça-feira, janeiro 03, 2006
Mare's hell e a volta para a civilização
Hey, I'm back!!
Uma semana de muita (mas muita) comida, muito sono, muita chuva, muita lama, mas também muita curtição!!
Desde ontem estava com coceira pra checar mails, navegar e escrever. No entanto, não obstante, infelizmente, quando cheguei e liguei o computador, tinha apenas 21 mensagens, 15 das quais bulk e trash. Alguns avisos de orkut, um mail da secretaria da pós lembrando do prazo para a entrega do relatório data-capes (tinha certeza, ô desgraça. Viu só Paula?!) e apenas 2 mensagens realmente pra mim...
Como diria um colega mineiro: ô inferno das éguas sô!
Uma semana de muita (mas muita) comida, muito sono, muita chuva, muita lama, mas também muita curtição!!
Desde ontem estava com coceira pra checar mails, navegar e escrever. No entanto, não obstante, infelizmente, quando cheguei e liguei o computador, tinha apenas 21 mensagens, 15 das quais bulk e trash. Alguns avisos de orkut, um mail da secretaria da pós lembrando do prazo para a entrega do relatório data-capes (tinha certeza, ô desgraça. Viu só Paula?!) e apenas 2 mensagens realmente pra mim...
Como diria um colega mineiro: ô inferno das éguas sô!
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