Tenho percebido que o cinema francês ultimamente voltou a ter uma cara. Depois da esquisitices (desculpem-me os cinéfilos e os profissionais do gênero) dos anos 60 e 70, a sétima arte em terras gaulesas ficou por muito tempo associada a escabrosas histórias de amor e traição, com uma dose de sexo que seria impensável na industria cinematográfica americana da era Reagan. E já emendo - antes de ser amaldiçoado por francófilos de plantão - pra mim.
E se não "l'amour terrible", outras películas esquisitíssimas nas décadas seguintes, mas sem a inovação da geração precedente. E o pior: com uma produção que pouco apelava aos sentidos (ao menos o principal, tratando-se da telona - o visual). Mesmo as eventuais tentativas de super-produção me pareciam re-encenações da sentença de Marx, seguindo a dica deixada por Hegel: a história se repete como farsa (ok, não sei bem quando aconteceu a tragédia no presente caso. Mas, aproveitando os parênteses: dou meu pitaco sobre as ocupações. Sou totalmente simpático aos objetivos, mas quem sabe uma rápida leitura no 18 - pularam essa parte na graduação? - não elevaria o nível das reivindicações revolucionárias?, e, então, talvez os cérebros dos vivos não sofressem tantos pesadelos com a tradição das gerações mortas que lhes emprestam a linguagem e a roupagem, e então de fato se atualizassem, e não apenas produzissem caricaturas de um tempo morto - principalmente de algumas coisas que já pareciam ultrapassadas até mesmo então). A velha máxima de que ninguém dá uma festa melhor do que os americanos fica comprovada - que digam as tentativas pífias de emular Oscar, Grammy, Emmy e outras estatuazinhas batizadas do entretenimento (eu morro de vergonha pelos organizadores de um MTV awards brasileiro, por exemplo). E isso acaba valendo também para outras áreas de atividade.
Claro, muita coisa boa sempre continuou a ser feita. Mas um novo momento, de verdade... creio que não (isso a despeito de uma safra sem fim de ótimos atores).
Ultimamente alguns filmes independentes têm sido uma boa surpresa. Mas geralmente são filmes europeus, não necessariamente franceses. As co-produções que envolvem financiadores, produção e atores de vários países não são raras. E, da mesma maneira que a BBC tem imensa influência na televisão e cinema britânicos, o Canal Plus têm atuado de maneira positiva, principalmente na Espanha e na França. É um exemplo de uma sociedade poderosa, que tem lá suas fortes relações com o Estado (lembra alguma outra?), mas que no geral prima pela boa qualidade das produções.
Não se trata de nenhuma Hollywood, mas existe agora uma fatia do cinema francês que conta com um financiamento generoso, o que acaba se refletindo na tela. E dessa vez parece que os diretores franceses não ficam tão perdidos na confecção de um blockbuster.
E diferente do que acontece na terra do Tio Sam, onde orçamento milionário não é necessariamente sinônimo de qualidade, os filmes franceses são, no mínimo, bom entretenimento. Mesmo os que de certa forma emulam uma fórmula que nos EUA já tem mostrado sinais de aferrecimento - leia-se filmes policiais e de gângsters (ou talvez não; estão vindo aí exemplos que me contradizem). O descomprometimento com o espectador e com a própria obra que parece tornar-se vigente em outras praias, via de regra ainda não aportou do outro lado do canal.
Os franceses ainda gostam de uma história romântica - e agora sem tanto o elemento sórdido de alguns anos antes - mas estão investindo pesado no que era antes monopólio absoluto de seus amis américains: os thrillers.
Hoje vi um, Ne le dis à personne (Tell no one), que é exemplo de uma boa história, que é também bem contada, mas com todos os outros ingredientes de um filme comercial. Performances muito boas, mas sem descuidar do lado "destrói carro, tiros, sangue e perseguição" que garante, não nos enganemos, a bilheteria.
Não foi uma surpresa, porque já esperava algo bom (apesar que, geralmente quando construo qualquer expectativa, isso é o ingresso para a decepção; então mais um ponto a favor). Mas foi um dos melhores filmes que vi no ano - uma história que não subestima o espectador e não entrega tudo mastigado, ocupando metade do tempo com o rodriguez óbvio ululante. Et c'est la verité.
Um dia desses preciso conferir uma teoria que está se formando na minha cabeça: que qualquer filme que a linda, competente e look-a-like da minha amiga Malu (que, por sua vez, detém essas e também outras qualidades), Kristin Scott-Thomas está, é muito bom.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário