Às vezes eu tenho esses arroubos espirituais. Sei lá, é quando meu ceticismo - já não muito convicto - entra em parafuso e dá lugar a algumas superstições e crendices diferentes.
Nem sei como começa e como termina. Mas fico meses pensando nas contas, na tese que anda parada, nas milhões de coisas muito terrenas e pragmáticas que preciso fazer e, de repente, me descubro rezando (da minha maneira toda particular), pensando em fantasmas, espíritos e na atmosfera diferente de um final de semana.
Acho que estou numa dessas fases. Estou achando tudo meio esquisito, pra começar com um certo mal-estar que me ronda esses dias - que, aliás, me impede de fazer qualquer coisa de produtiva (como se eu precisasse de mais desculpas pra ser vagabundo). Ontem chegou às raias de dar umas tonturas (talvez o fato de que tenho bebido praticamente todo dia desde meados de outubro ajude). Mas, enfim, é algo que há algum tempo queria entender melhor e não consigo.
Em São Carlos, no final de semana, acabei estacionando numa praça de lá. Como era sábado, a polícia não multaria quem não tivesse o cartão de zona azul depois da 1:00. Era quase meio-dia, então não achei que haveria qualquer problema.
Saio do carro, fecho, começo a andar e, meio com o canto do olho, reparo num carinha na esquina, olhando pro meu carro e anotando algo num bloquinho. Claro que fiquei meio incomodado. Não que o cara fosse um amarelinho à paisana, pensei, mas vai saber o que ele estava fazendo. A quantidade de novos golpes que eu fico sabendo quase todo dia, eleva meu nível de alerta ao vermelho com facilidade. As pessoas são muito criativas para se dar bem. Claro que, quando você sabe de um desses golpes, eles já não são mais aplicados e inventam outro mais mirabolante. Mas dá pelo menos para não subestimar a capacidade de charlatães e bandidos de toda sorte por aí.
Voltei. Decidi tirar o carro dali e estacionar mais pra frente. É, ele anotava a placa mesmo.
"Com licença, o senhor quer alguma coisa?"
"Você sabia que a placa deste carro é numerologicamente muito boa?"
(Misto de expressão com suspeitas com aquela estupefatação e preocupação de quem percebe estar na frente de um potencial maluco místico)
"Pois é, deixe-me mostrar..."
(Anota a placa e começa um complicado cálculo de somas e conversões de números e letras)
"É uma placa 6, que tem poderes muito diferentes. É ótima para não causar acidentes. Tem muita gente que morre por aí em acidente de carro e não se sabe porque. As placas. São as placas. Você tem sorte. Seria melhor apenas se fosse uma placa 3."
(Cara de quem começa a ficar assustado)
"Sinto muito, estou com pressa. Faça o favor de me dar esse papel."
Aí vou embora até a esquina seguinte com uma sensação não muito boa. Será que há uma numerologia que governa minha perícia automotiva? Ou que vai colocar em meu caminho os infelizes ineptos com placas não múltiplas de 3?
Sequer me senti muito reconfortado com o fato da minha placa ser boa. Se fosse ruim ele me diria? E se me dissesse, voltaria dirigindo pra casa? Tudo bem, não sou assim tão crédulo, mas também não sou totalmente imune a um desses malucos. Guimarães Rosa teria respeito pelo cara. Talvez eu também devesse ter. Por via das dúvidas.
Enfim, a semana passou meio esquisita.
Ante-ontem, pleno Halloween, descobri que Geertz morreu.
A única coisa boa? O Timão ter saído de vez do rebaixamento.
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3 comentários:
nossa chris, sua historia me fez lembrar da parte que eu começei a ficar com mais medo do tal senhor no banco...assim que eu falei pra ele qto ele podia sacar, ele começa a falar umas coisas baixinho, e com a mao na cabeça, eu achei que ele estivesse entrando numa espécie de surto, meio que olhei pra filha dele em busca de ajuda pra compreender o incompreensível ou de algum conforto achando que ela tb perceberia que o pai é maluco, e aí ele se explica: estava fazendo uma conta maluca com o numero nove, diz ele que esse numero é bom pq é o numero de meses da gestação, e me dá a quantia final e misticamente aceitável para o saque. meu deus, nossa senhora, oh lord! meeeeeeeeeeeeedo. agora to rindo pra te falar a verdade.
ai, ai, coisa engraçada. e as aulas chris? continuamos?
;-)
ah, e escrito nas estrelas é um otimo título pra esse seu post. hehehehhe...e o cara te deu de volta o papelzinho mesmo?
Puxa.... Hurley things happen... Não sabia que o Geertz tinha falecido... que pena...Também ando um pouco sensível a essas coisas... talves seja a imersão total no Lost... não tenho tido vontade de fazer mais nada... só assistir...uma espécie de obssessão de resolver tudo sem fazer nada..Acho que no fundo eu adoraria que houvesse mais mistério e magia no mundo...forças ocultas...sempre sonhei com isso... poder começar uma vida menos banal... Com uma busca verdadeira e plena de sentido... The chosen one... coisas assim... Veja um post que fiz no blog chamado o Caráter Tépido da Alma:
http://melancholylakes.blogspot.com/
Grande abraço...
Celo
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