quinta-feira, agosto 10, 2017

Da inércia da felicidade


Talvez seja algo sintomático da lama atual...

Tenho percebido o quanto demora para ficar bem de fato. Digo, feliz mesmo. Porque, claro, momentos alegres temos sempre: por menor que sejam, descobri há muito que basta apreciá-los e aí a plenitude pode vir do singelo e do minúsculo.

Mas ficar feliz mesmo, daquele jeito de andar sorrindo e alguém te dizer, do nada, "nossa, como você está bem!", não é tão comum. Na verdade a gente pode até sempre sorrir, mas esse elogio só nos dão quando estamos brilhando.

Pelo menos é assim pra mim.

Mas eu estava feliz, até hoje de noitinha. Muito feliz - daquele nível de ficar quase eufórico. E sei bem como foi o processo: foi uma boa notícia aqui, outra ali, um elogio, uma realização, um projeto que parece que vai dar certo, o prazer que comecei a sentir desenhando... apesar de todo o resto acontecendo ao redor, pessoalmente estava bem. Fui juntando belezuras, colecionando bons momentos.

É um processo de vários dias. Talvez semanas. Em que as coisinhas bacanas vão se amalgamando em um arzinho de júbilo que esquenta o corpo. E então, assim, de repente, basta uma coisa ruim acontecer, um sofrimento injusto te recordar que o mistério parece ser mesmo ter que saber como lidar com as dificuldades, que tudo parece tomar outra cor. O mundo muda. Os cheiros, os tons, o éter.

E como fazer quando todos à sua volta vêm notícias ruins umas atrás de outras?

Eu tenho tentando fazer bem, também me ouvir sobre o que me faz feliz. É difícil no meio da situação atual, mas acho que tenho conseguido mais ou menos. Mas hoje veio um baque. Daqueles de ter que se recolher um pouco. E aí, aquela vontade de expandir, de abraçar, fica um pouco murcha.

Pelo menos tive uma boa sequência.



Sobre o desenho - eu quero tentar escrever mais aqui e colocar sempre um desenho que fiz pra acompanhar (ou vice-versa). Uma das grandes alegrias ultimamente, um processo terapêutico mesmo, é desenhar. Totalmente inspirado nas coisas lindas que a Karina Kuschnir faz. O blog dela, https://karinakuschnir.wordpress.com/, é maravilhoso, e pensei em fazer algo assim por aqui: um texto de parzinho com um desenho. Até mesmo porque isso pode me estimular a habitar mais esse espaço aqui - algo que venho falando que vou fazer há tempos. Shame on me. E tenho desenhado bastante, alguns eu tenho gostado do resultado e quero mostrar aqui. Mas hoje resgatei um que fiz já há alguns meses, quando minha mãe começou o tratamento de quimio dela. Hoje até que não gosto tanto do desenho, mas achei que não faria muito sentido colocar um desenho muito feliz agora. Lembrei desse, que fiz num dia com sentimentos ambíguos, na primeira visita ao centro de oncologia: um pouco de medo, de revolta, mas também de admiração pela resiliência das pessoas e a capacidade de ajudar e ser solidário. É um pouco como estou me sentido agora. Espero que da próxima vez eu possa colocar um desenho mais feliz (ainda que um amigo tenha me falado que os meus rabiscos expressam uma tristeza profunda... não sei, preciso ver se mais gente sente isso e aí tentar pensar mais...).

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