segunda-feira, janeiro 18, 2016

Pensamentos avulsos

Quantas vidas cabem numa pessoa com convicção suficiente pra não se satisfazer ou não ter convicção suficiente pra teimar? Pensei nisso hoje, lembrando de lembranças de um outro eu com tantos sonhos tão diferentes. Afinal, quando é que esses sonhos deixam de definir e viram memórias? E como saber que essas memórias de fato não são coloridas por sonhos novos?

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Hoje fui pagar o IPVA do carro, mas tinha esquecido que era possível quitar todas as taxas juntas. Paguei primeiro o IPVA e depois, quando fui ver o licenciamento, descobri que não tinha como pagar separado. Só pagando esse combo de taxa – com o IPVA incluído de novo. Toca pegar senha pra ser atendido por bancário humano. Desvio da loira grossa que fica na mesa da frente, distribuindo sua cota de miséria cotidiana – será que é castigo atender o público? Quase sou atingido por um espirro tão grande, de um grande moço novinho com cara de entediado que acompanhava a mãe no banco, que pensei que os seguranças fossem sacar suas armas, achando tratar-se de um assalto (tenho pavor de segurança de banco e mais ainda quando chega um carro forte). Dez e dez da manhã, já existe uma fila considerável. Espera, espera. A bancária humana, depois de ouvir meus lamentos, diz que não é possível pagar mais separadamente. “Agora tem que esperar dois dias e tentar de novo, quando o sistema computar o pagamento já feito”. “Dois dias?”. “Sim, dizem que é online, mas não é coisa nenhuma”. Volto pensando nas vantagens da tecnologia a serviço da burocracia. É por essas que eu continuo não achando que estou perdendo muita coisa sendo um desfavorecido computacional. Não quando tudo ainda é decidido por alguém sem muita boa vontade.

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Fiquei uma semana na praia. Em Itamambuca, litoral norte de São Paulo. Dias tranquilos, muita chuva, muito sono, então consegui descansar – não sem brincar com o bebê-sorriso, Theo, e cozinhar bastante com a Luiza, que se mostrou uma cozinheira de mão cheia. Nas tardes preguiçosas, nos intervalos de trabalho de um textinho que estou escrevendo, li Flush, da Virginia Woolf, presente da querida Karina – e gostei muito! Não sem algum sofrimento (tenho problemas com os problemas dos animais), mas completamente fascinado pelo texto e pela perspicácia da perspectiva canina sobre o mundo. A passagem sobre a experiência constituída pelos cheiros é fantástica e deliciosa de ler! E pensar que foi um livro escrito despretensiosamente, pra descansar de outros projetos... Tinha levado um livro do Schneider, mas a biblioteca da casa que alugamos era muito interessante, então resolvi investir em outra ficção. Achei lá um romance da Agatha Christie, que eu sempre gostei de ler quando mais novo: Morte na rua Hickory. Foi interessante ler dois best-sellers de duas inglesas mais ou menos contemporâneas, num intervalo curto de tempo. A prosa de Christie é mesmo muito boa e fácil de ler. E os mistérios ainda entretêm – eu me surpreendi com a resolução do crime, pela dedução de Poirot (interessante que este é um dos casos em que ele recebe bastante ajuda da polícia – ele está mais velho e já dá sinais de que não é infalível). Mas é um romance que envelheceu. Diferente do livro de Woolf, que dá pra ler e reler - e imagino que continue assim por muito tempo.

Um comentário:

Karina Kuschnir disse...

Ohhh, amei este post! É totalmente o espírito do Flushbacks que tanto admiro! A historia do banco e do ipva ficou perfeita -- naquele ritmo de filme dos irmaos Cohen que voce emula com perfeição! Fiquei mais uma vez morrendo de inveja dessa casa na praia e também saudosa das duas autoras inglesas que amo. Você só podia ter sido mais bonzinho e nos explicado porque o livro Flush se chama Flush! Keep writing, Chris, desse seu jeito ótimo e tão bom de ler!!!