quinta-feira, dezembro 10, 2009

República dos bananas

Vi esses dias que o Kusturica vai fazer um filme sobre o Pancho Villa. Sou fã do cara (e das trilhas dos filmes dele), então estou bem ansioso para ver o resultado.
Mas por falar em Kusturica, fiquei aqui pensando como seria um Underground versão brasileira...

João José, ficou 20 anos em coma no hospital D. Pedro I (ou talvez, como na versão dos balcãs, escondido num bunker qualquer, planejando a revolução que ia livrar seu país das garras da dominação estrangeira e do FMI).
Quando finalmente acordou, certa manhã, contrariando todos os prognósticos, descobriu que sua família há muito já não o visitava. Seus pais haviam falecido 10 anos antes. Seus irmãos, desde que deu entrada no hospital, vítima de um atropelamento, visitavam com cada vez menos frequência, numa razão inversamente proporcional ao amortecimento de suas consciências: um dia simplesmente o esqueceram, ele que há muito não era seu irmão, mas um amontoado de carne, tubos, aparelhos e despesas que não dava nada em troca. Nunca teve filhos. E seus sobrinhos sequer sabiam que aquela figura adormecida era um tio.
Mas João José despertou, sem razão aparente (o dia era completamente medíocre, não coincidiu com nenhum grande acontecimento que pudesse marcar a ocasião).
Assim que conseguiu lembrar de como emitir sons, puxou conversa com uma enfermeira que por lá estava.
"Que aconteceu?"
"O senhor sofreu um acidente e ficou em coma."
"Mas por quanto tempo?"
"Vinte anos."
"Quanto?"
"Sim, sei que deve ser difícil entender isso. O senhor já virou patrimônio do hospital. Quando eu comecei a trabalhar, há 14 anos, o senhor já estava por aqui. Pouca gente viu o senhor ser admitido. Acho que o Seo Henrique, o faxineiro, pode se lembrar da época."
João José não pôde evitar pensar que havia se tornado um mascote. Na verdade, pior, mobília do hospital.
"E minha família?"
"Sei não senhor. Há anos ninguém vem aqui."
"E como vou fazer agora? Como vou sair por esse Brasil afora, sem família, amigos ou emprego?"
"Aqui não é mais Brasil não senhor."
"Como assim?"
"O Brasil não existe mais."
"Não existe?"
"Sim, há alguns anos atrás o Estado de São Paulo fez um plebiscito que aprovou a separação do país. Um pouco depois houve no Rio Grande do Sul uma revolução que declarou independência. Eles se uniram com a província de Buenos Aires, que também se separou da Argentina e formaram a República Cisplatina."
"E o que aconteceu com o resto do país? E o Nordeste?"
"Foi comprado por um consórcio de investidores alemães e ingleses e agora é um território independente, de pousadas e resorts de luxo."
"E o Norte, a Amazônia?"
"Como naquele jogo, '24 territórios a conquistar'. O que era o Centro-Oeste também."
João José parou por um instante, tentando compreender a magnitude do acontecimento.
"E agora, como se chama o país São Paulo?"
"República Paulista da Ordem da Maçonaria."
"E o que aconteceu com Brasília? O que é lá agora?"
"Foi aterrada e virou um estacionamento."
João, atônito, achou que não suportaria mais revelações desse tipo e resolveu que simplesmente iria embora dali.
"Quando vou poder ter alta aqui do hospital?"
"Só acertar a papelada.... Por sinal, agora o hospital se chama Julio de Mesquita. Os nomes 'brasileiros' foram substituídos por personagens da história de São Paulo."
"Meu Deus. Acho que preciso de um cigarro."
"Shhhh senhor, isso agora é crime."

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